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Grupos Quânticos

1. Aqui se pretende expor os elementos de grupos quânticos de forma simples e direta. As construções não serão apresentadas da maneira mais geral possível, e serão sempre acompanhadas no exemplo (já extremamente interessante) do grupo quântico ``mais simples'' Slq(2), deformação do grupo algébrico semisimples Sl(2). Um contexto definitivamente algébrico será adotado: por exemplo, evitaremos menções a álgebras C*, e outros objetos analíticos. A virtude maior desta filosofia é destacar claramente a natureza (co- ou contra- variante) das operações envolvidas, dos diversos tipos de produtos, de cada conceito. 2. Não há definição satisfatória universalmente reconhecida do que seja um grupo quântico. Todas as propostas em vigor sugerem a idéia de deformação de um objeto clássico, que pode ser, por exemplo, um grupo algébrico, ou um grupo de Lie. E em todas as propostas os objetos deformados perdem as propriedades de grupo: assim, ``grupos" quânticos não são grupos. O que sempre se procura preservar nas deformações é o entendimento das diversas representações que os objetos admitem. 3. Fixemos as idéias postulando uma dualidade básica que a Matemática deste século refletiu em uma quantidade de linguagens diferentes: por um lado, são estudados objetos X que possuem uma estrutura geométrica ou topológica. A tais objetos são associadas construções algébricas A(X), que podem ser, por exemplo, álgebras de funções definidas no conjunto X, ou o espaço de seções de um fibrado vetorial. Frequentemente gostaríamos de reler nestas álgebras as estruturas geométricas originais, isto é, gostaríamos de recuperar em A(X) nossos objetos iniciais X através de alguma noção de espectro S(A(X)) da álgebra A(X): a situação mais desejada é quando voltamos a ter alguma forma de isomorfismo $X\simeq S(A(X))$. O retorno à Geometria a partir das álgebras A(X) através de um espectro sugere considerarmos espectros S(A) de álgebras mais gerais A. Tais espectros são objetos que possuem ainda uma Geometria reminescente, quase sempre muito interessante. 4. Esta separação básica, por um lado a Álgebra em A, e por outro a Geometria (ou Topologia) em X ou em S(A), é uma situação ideal: os objetos que vemos na realidade matemática nos chegam frequentemente misturados. São, por exemplo, grupos topológicos, ou espaços vetoriais topológicos, objetos que tem simultaneamente estruturas algébricas e geométricas de alguma forma compatíveis. A aplicação dos funtores usuais A de algebrização em um objeto X assim fornece estruturas algébricas adicionais sobre os objetos já algébricos A(X), que passam então a admitir, por dualidade, co-multiplicações. 5. Como um exemplo-paradigma tomamos um grupo algébrico linear X: algebricamente, um grupo, geometricamente uma variedade... algébrica (a notação consagrada não pode evitar armadilhas); além disso, as operações de grupo são morfismos de variedades algébricas. O exemplo que nos será mais caro é o grupo algébrico Sl2(k). Como para toda variedade algébrica, podemos considerar um funtor de algebrização que associa a cada variedade X seu anel de funções regulares R(X). A estrutura adicional de grupo em X doa, por dualidade à la Yoneda, uma estrutura de co-algebra em R(X) (definições precisas mais tarde). Como segundo exemplo-paradigma tomemos X um grupo de Lie, isto é: geometricamente uma variedade, algebricamente um grupo, com a compatibilidade fundamental de serem diferenciáveis as operações algébricas. Também aqui se manifesta o ubíquo Sl2. Um funtor de algebrização básico para uma variedade é a consideração de seu fibrado tangente; no caso do grupo de Lie X, este funtor fornece a álgebra de Lie ${\cal L}(X)$, o espaço tangente na identidade. Um funtor intra-algébrico agora asocia a cada álgebra de Lie ${\cal L}$ a álgebra (associativa) envolvente ${\cal U}({\cal L})$ de forma universal (este funtor, que deve ser chamado de funtor de Poincaré-Birkhoff-Witt, é o adjunto à esquerda do funtor que a cada álgebra associativa A associa a álgebra de Lie com o colchete dado da forma ``usual'': [a,b]=ab-ba). Estes exemplos serão nossos guias. 6. Se o objeto inicial X for um objeto assim misto, dotado de estruturas algébricas e geométricas simultaneamente, as deformações que procuramos operam nas álgebras A(X), enriquecidas por co-multiplicações, para gerar objetos Aq(X) da mesma natureza igualmente enriquecida. O parâmetro q de deformação intervem nas definições das álgebras A(X) (ou mais simplesmente A) de uma forma que a primeira vista pode parecer arbitrária: confiamos então na relevância destas definições distorcidas que uma quantidade de aplicações físicas, muitas vezes não relacionadas entre si, indica. Poderíamos pensar em aplicar espectros e obter alguma Geometria em
S(Aq(X)), mas a ênfase maior das aplicações tem sido em recuperar a teoria de representações de X, que em geral é equivalente à de A(X), para as álgebras deformadas Aq(X). 7. (Sobre estas notas) O conceito de grupos quânticos foi motivado por problemas vindos de um grande número de situações físicas, e com isso o entendimento das idéias que motivaram a teoria requer naturalmente um amplo conhecimento anterior. No entanto, o trabalho de manipulação da teoria pode ser efetuado em um nível muito mais modesto; estas notas procuram contemplar situações de pré-requisitos bastante diversas. Idealmente, qualquer leitor com algum interesse poderia achar nelas um lugar de trabalho matemático ativo. Alguma informação categórica está recolhida em apêndice: a mistura de estruturas que os grupos quânticos exemplificam torna a linguagem categórica um dado essencial.


Índice do Capítulo 5 I. Bons Antecedentes Algébricos

I.1 Grupos Clássicos: Definições

I.2 A Geometria dos Grupos Clássicos

I.3 A Álgebra dos Grupos Clássicos

I.4 Álgebras de Lie e Álgebras Envolventes

I.5 Representações II. Grupos Quânticos

II.1 O Plano Quântico, as Matrizes Quânticas e os Grupos Quânticos

II.2 A Álgebra Envolvente

II.3 Módulos


 
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Nicolau C. Saldanha
1999-08-10