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Re: O dia que nao acaba





Elon Santos Corrêa wrote:

>  Tem que haver um "salto" ! Caros amigos, quanto a questao: 1 =
> 0,999... , gostaria de suscita-la. Por exemplo, hoje e dia 18 de abril
> ate as 23 horas 59 minutos 59 segundos e 0,999... de um segundo. Se
> nao houver um salto, (ponto de parada) quando comecara o dia 19, ou
> ainda, se a aproximacao nao parar quando acabara o dia 18 ? Aproveito
> para perguntar a opiniao de todos, 1 = 0,999... ? (Igual, nao que
> representa) Ate mais, Elon.

bem, a minha resposta não é tão matemática assim (é mais filosófica),
mas fala justamente do mesmo assunto... então...

É possível expandir o seu pensamento: da mesma maneira que
23:59:59,999... não se torna 24:00:00 , nenhum segundo passa de um para
outro, nem nenhum décimo de segundo, nem nenhum centésimo de segundo -
na verdade, por esse pensamento, ou existe um átomo de tempo (o "salto"
do qual vc falou, que seria um momento que passa pro seguinte sem passar
pela sua metade, nem pelo seu quarto etc. etc.) ou o tempo simplesmente
não passa. ^^

O mesmo problema (causado por 1 = 0,999... , pois 1 - 0,9999...
resultaria numa partícula infinitamente pequena = 0) já foi levantado
por Zenão de Eléia, um filósofo pré-socrático eleata. Ele mostra que, se
vc considerar dimensões de espaço e de tempo infinitamente pequenos
(como seria o caso), vc vai ter q lidar com a ausência do movimento -
daí os famosos "paradoxos de Zenão", através dos quais ele conclui, por
exemplo, que um homem levaria um tempo infinito para atravessar um
estádio correndo, que uma flecha ao ser atirada fica parada no ar e que,
se Aquiles e uma tartaruga estão disputando uma corrida e a tartaruga
larga na frente, ela necessariamente vence.

Zenão dizia que você teria que considerar essa partícula infinitamente
pequena de tempo e espaço (pois, senão, ou vc joga todo o movimento fora
ou trabalha com átomos de tempo e espaço - representação impossível!), e
concluia, portanto, não que os paradoxos estavam certos - mas sim que o
movimento é contraditório em si, inalcançável através da lógica (isso
acabaria por desembocar numa confirmação do pensamento parmenídico)

No entanto, os gregos possuíam um conceito de infinito muito
diferenciado do nosso - e, portanto, do que seria essa partícula
infinitamente pequena (que para nós se manifesta como 1 - 0,999...) no
tempo e no espaço. De fato, é muito simples igualar a zero e resolver o
problema - só que nem sempre isso satisfaz uma mente mais rigorosa.
Outro problema é que os gregos acreditavam que vc não podia descartar
essa partícula infinitamente pequena - pq, se vc faz "0,0000...1" = 0,
vc estará fazendo "0,00000...1" x 2 = 0, "0,0000...1" x 3 = 0, e assim
por diante, o que, acreditavam eles, faria com que você desconsiderasse
grandezas tão grandes quanto metros e quilômetros.

(Parece-me, no entanto, que para obter algo substancial de uma partícula
infinitamente pequena seria necessário repeti-la infinitas vezes - mas
será essa representação possível? como algo que nós podemos igualar a 0
se tornar alguma coisa diferente de zero se repetidas infinitas vezes?
Isso requer também que se trabalhe com infinitos diferenciados - pq, da
mesma maneira q 0,0000...1 x n [n -> infinito] = 1, vc teria 0,000...1 x
m [m -> infinito] = 2; seriam esses infinitos que "n" e "m" tendem para
diferentes? mas e se fizessemos 1/m e 1/n , teríamos partículas
infinitamente pequenas diferentes, também?)

Os paradoxos de Zenão permaneceram sem solução até o século XIX, quando
Cantor supostamente os resolveu através da matemática. Eu não conheço
essas soluções, e faz algum tempo pedi nessa lista que alguém que a
soubesse a explicasse, mas infelizmente não recebi resposta.

bem, espero ter ajudado na sua reflexão a respeito de flechas que não se
movem, corredores que não saem do lugar e dias que nunca acabam. :)