Suponha dados inteiros n > 1, P e Qtais que
D = P2 - 4Q não é um quadrado módulo n.
Seja
Lembramos que vimos no capítulo anterior que se p > 2é primo e d não é um quadrado módulo p então
é um corpo com p2 elementos.
Proposição 3.17:
Se n é primo e D não é um quadrado módulo nentão
em
.
Dem:
Suponhamos que n seja primo.
Em K temos a identidade
(X+Y)n = Xn + Yn:
ela segue do binômio de Newton e do fato que
Analogamente, se n é primo, temos
em K.
Assim, ainda em K,
.
Segue da fórmula para Um que
.
Proclamamos este resultado como uma proposição:
Proposição 3.18:
Se n é primo ímpar,
e as seqüências Um e Vm são definidas pelas recorrências
então
.
Dem: Acima.
Esta proposição nos dá mais um algoritmo para testar a primalidade de n.
Proposição 3.19:
Se é primo,
,
e D é quadrado módulo nentão
.
Dem:
No anel
,
2 é invertível, assim como D e
.
Em K temos, portanto,
Em suma, se
é primo,
,
então
é múltiplo de n,
o que se deve ao fato de
ser igual a
se
no anel
.
Observemos agora que se
em Kentão existe um inteiro r tal que
Proposição 3.20:
Se é primo,
e
então,
para todo natural
,
é
múltiplo de nk, onde
.
Dem:
Vamos supor, por hipótese de indução, que
,
.
Elevando os dois lados da equação à n-ésima potência
temos
Proposição 3.21:
Sejam com
, e (Uk)uma seqüência de Lucas
(com U0 = 0, U1=1 e
Uk+2 = PUk+1 - QUk).
Se
é não vazio então existe
tal que
se e somente se
.
Tal a será denotado por
.
Dem:
Observemos inicialmente que para todo
,
temos
Um+n = UmUn+1 - QUm-1Un . De fato, considerando mfixo e n variável, os dois lados da igualdade satisfazem a mesma recorrência
de segunda ordem
Xk+2 = PXk+1 - QXk ,
,
e
temos, para n=0,
(pois
U1=1 e U0=0), e, para m=1,
(pois U2=P, U1=1 e
Um+1 = PUm - QUn-1), o que implica a
igualdade para todo
.
Como conseqüência, se
e
então
. Por
outro lado, se
e
, com
então, como
(fazendo
,
)
temos que r divide
, mas
e
divide
(o que pode ser
facilmente provado por indução a partir de
), donde
também é igual a 1, logo
. Assim,
, e
,
, o que implica que Ar é
da forma descrita, com
(de fato, se existe
que não
seja múltiplo de a, existiriam b e c naturais com k = ab+c, 0 <
c < a, mas
e, como
,
, logo
c=k-ab pertenceria a Ar , contradizendo a definição de a.
Teorema 3.22:
Seja n > 1 um inteiro ímpar. Se existe um inteiro
d primo com n tal que para todo fator primo r de n+1existem P(r), Q(r) e m(r) inteiros com
e
tais que a seqüência
de Lucas associada
(Uk(r)) satisfaz
e
então n é primo.
Dem:
Seja
a
fatoração prima de n+1.
As hipóteses implicam que
divide
para
.
Por outro lado, se
é a fatoração prima de n,
segue da Proposição 3.20 que
divide
(A hipótese
é satisfeita.
De fato, como
,
não divide D(ri), e,
se
dividisse Q(ri),
não dividiria P(ri),
e teríamos
para todo
,
e
não dividiria
Uk(ri) para nenhum
,
contradizendo o fato de n dividir
Un+1(ri)).
Assim, se
,
temos que
divide
UM(ri),
para
,
.
Isso implica que
divide
UM(ri) para
,
e portanto
para
,
donde n+1 divide M.
Temos agora duas possibilidades:
(i) s=1. Nesse caso temos que n+1 divide
o que é absurdo
se
,
pois teríamos
,
e se
temos que
divide
,
o que implica
,
ou seja, n é primo.
(ii) . Nesse caso
que é sempre menor que n(pois
)
e portanto é um absurdo que n+1 divida M.
A seguinte proposição, devida a Morrison, é análoga ao resultado de Pocklington:
Proposição 3.23:
Seja N > 1 um inteiro ímpar e N+1=FR.
Se existe um inteiro d primo com N tal que para todo fator primo r de Fexiste uma seqüência de Lucas Un(r) associada a inteiros
P(r), Q(r) e um inteiro m(r) primo com Ne
tal que
e
então cada fator primo
de
N satisfaz
.
Dem:
Se
é a
fatoração prima de F então
para
.
Se
é um fator primo de N,
também temos
.
Como
segue que
, donde
, e portanto
divide
para
.
Por outro lado,
divide
,
donde
divide
para
divide
.
Corolário 3.24: Nas condições da proposição, se F > R então N é primo.
Dem:
Qualquer fator primo de N deve ser congruente a 1 ou a
-1 módulo F, mas, se N é composto, deve ter um fator primo menor ou igual
à sua raiz quadrada, que deve, pois, ser igual a F-1. Como
,
F2-1 > N, logo
,
donde o outro fator
primo de N também deve ser igual a F-1, e teríamos
,
que só seria múltiplo de F se F fosse igual a 2, e F-1igual a 1, absurdo.
Proposição 3.25:
Seja n > 1 um inteiro ímpar. Se para todo fator
primo r de n+1 existem
P(r), Q(r) inteiros
com
onde
D(r) = (P(r))2 - 4 Q(r)tais que a seqüência de Lucas associada
(Uk(r)) satisfaz
e
então n é primo.
Dem:
Seja
um fator primo de n.
Para cada fator primo r de n+1temos que
e
.
Assim, se
é a maior potência de rque divide n+1, então
divide
,
como acima.
Em particular,
divide
,
donde n+1 divide
.
Assim,
donde
,
o que implica na primalidade de n pois n não tem nenhum fator
primo menor ou igual à sua raiz quadrada.
Vamos agora dar outra prova do critério de Lucas-Lehmer usando os resultados anteriores.
Dem:
A seqüência de Lucas associada a P=2, Q=-2, é dada pela
fórmula
.
Temos
,
onde
.
Além disso,
U2k = UkVk para todo
.
Para
temos
(onde S0=4,
Sm+1 = Sm2-2,
).
Se n > 2 e
Mn =
2n-1 divide Sn-2 então Mn divide
V2n-1,
logo também divide
UMn+1 = U2n = U2n-1 V2n-1, e, como
,
e
Vk2 - 12Uk2 = 4(-2)k, segue
que
V2n-12 - 12U2n-12 = 22n-1+2, e, se Mn dividisse
, dividiria também
22n-1+2, absurdo. Assim,
pelo Teorema 3.22, Mn é primo.
Por outro lado, se Mn é primo, como D=12,
,
logo Mn divide
UMn+1 = U2n, e,
como
pois
(já sabemos que n deve ser um primo ímpar).
Temos
,
que é igual a
em
(pois
)
donde
e portanto
.
Assim, Mn divide Sn-2, o que
conclui nossa nova demonstração do critério de Lucas-Lehmer.
Se N é um primo ímpar e d não é quadrado módulo
N, então
é um corpo finito com N2 elementos e
portanto existem inteiros a e b tais que
é uma raiz primitiva de K.
Sejam
e, para
,
.
Temos
U0=0, U1=1 e
Um+2 = 2aUm+1 - (a2-db2)Um para todo
.
Temos ainda
em K,
senão x pertenceria a
e
dividiria N-1.
Assim, b e
são invertíveis em K e,
se P = 2a,
Q = a2 - d b2 então
D = P2 - 4Q = 4d b2satisfaz
.
Pela proposição 3.18,
.
Por outro lado, se m é menor que N+1, caso
N divida Um teríamos
em K, donde teríamos em K,
.
Pela proposição 3.17,
,
logo
x(N-1)m = 1, absurdo, pois
.
Isto fornece recíprocas para os resultados desta seção.